
Existem diversos tipos de pessoas apaixonadas por aviação, desde aquelas que sabem apenas diferenciar um Boeing de um Airbus, até aqueles “experts” que sabem tipo de motor, configuração da aeronave e colecionam a “placa” das mesmas, que são as matrículas. E aí é que surgem as perguntas feita por diversos leitores:
“Fui no GRU Airport e vi um Boeing da Aeroméxico, mas ele tinha matrícula N alguma coisa, que nem os aviões da American Airlines.”
“A Avianca é americana? Porque pousou um Airbus deles no Galeão com matrícula dos EUA.”
E como tudo na aviação (com exceção de algumas regras da ANAC) tem explicação lógica, é o que falaremos a seguir. E de antemão: não, a Avianca não é americana. É uma empresa adquirida há anos pelos irmãos Efromovich, que são brasileiros-bolivianos-polacos-colombianos. Muitas nacionalidades, mas nada de Estados Unidos da América.
Para começar é necessário entender que a aviação é uma das áreas que mais simboliza a globalização e o fim das fronteiras. E foi uma das pioneiras nisto com a criação da Organização Internacional da Aviação Civil, a OACI/ICAO em 1944. De lá para cá, diversos regulamentos foram criados, instruindo países e pessoas na aviação sobre tudo da área. Mas estes regulamentos são “recomendações”, e não leis (até porque cada país é soberano).
Desta maneira, cada país decide quais regulações da ICAO irá adotar, quais irá adaptar e quais não irá utilizar. A maioria dos países adotam a maioria dos regulamentos, o que facilita os voos. E para proteger as empresas nacionais e os empregos do país, os governos determinam que voos domésticos sejam operados por companhias nacionais, com aeronaves registradas no país e com pilotos nascidos ali. Mas não são todos.
Bandeira de Conveniência

O Brasil é conhecido por ter uma alta carga tributária, similar a países da Europa por exemplo, e distante dos EUA, Cingapura ou algum dos chamados “paraísos fiscais”. E é aí que entra a chamada “Flag of Convenience”, ou simplesmente Bandeira de Conveniência. O termo se remete à ação de registro de uma empresa/aeronave/navio ou qualquer outro bem em um país diferente daquele de operação ou origem do bem.
Muitas empresas fazem isso para pagar uma carga tributária menor, e não é diferente na aviação. As leis da Colômbia, El Salvador, México e outros países permitem que uma empresa nacional instale uma filial no exterior (no caso os EUA), registre a aeronave lá, mas opere-a como se fosse da matriz em voos domésticos, desde que tenha tripulantes e a bandeira do país de origem da matriz.
É o caso do A321 que ilustra a matéria desta capa. Uma aeronave da Avianca El Salvador (anteriormente TACA) que possui matrícula americana mas com uma bandeira de El Salvador. Na prática isso não muda nada para o tripulante ou passageiro, mas tráz uma redução de custos para o operador devido ao gasto menor com impostos.
O mesmo se segue na Aeroméxico, que inclusive voa com um Boeing de matrícula irlandesa, o 737-800 de matrícula EI-DRA. A LATAM Colômbia por sua vez tem aeronaves de matrícula chilena.
Bandeira do Lessor? Não!
Uma rápida pesquisa no site da agência de aviação americana, a FAA, mostra que o N697AV está registrado no nome do Wells Fargo, baseado na cidade de Salt Lake City, no estado americano do Utah. O Wells Fargo é um banco americano (e um dos maiores do mundo), e como explicado neste artigo anterior, ele compra a aeronave e faz o leasing (aluguel) dela para a companhia aérea.
Por diversas vezes a pergunta que é o título desta matéria foi respondida desta maneira: “É por causa do lessor da aeronave, que é americano/irlândes”. Não é bem assim, é verdade que o Wells Fargo é americano e o dono propriamente dito da aeronave, mas isso não obriga em nenhum momento a aeronave estar registrada como americana, até porque a regra fala que o responsável pela mesma é o operador, no caso a Avianca.
Prova disso é a Azul, que possui diversos aviões do Wells Fargo. Um deles é o Embraer E190 PR-AZC, registrado totalmente como uma aeronave brasileira conforme consta no Registro Aeronáutico Brasileiro, o RAB. A diferença é que no site da FAA só mostra o proprietário e não o operador, que no caso é a Avianca Airlines Inc, subsidiária da Avianca que possui escritório e sede no coração de Nova Iorque.
Brasil possui algumas regras flexíveis
Recentemente se ouviu uma polêmica na “pilotosfera”, como diz o nosso colega Raul Marinho. A tal “polêmica” envolvia a LATAM: o primeiro voo da nova rota Salvador – Miami foi operado pelo Boeing 767-300ER de matrícula chilena CC-CXG, com pintura da LAN e supostamente seria “um desrespeito às leis trabalhistas a LATAM utilizar aviões e pilotos chilenos para uma rota saindo do Brasil para os EUA”.
Como a companhia esclareceu, e falamos acima, cada país tem sua regra. E o Brasil tem a própria: o nosso Código Brasileiro de Aeronáutica exige que voos de empresas brasileiras sejam operados por brasileiros natos ou naturalizados (salvo exceções de treinamento e contingências). A nacionalidade da aeronave de nada importa, afinal o que muda são apenas as cinco letras na fuselagem.
Mas não vemos a Aeroméxico com um PP-MEX ou American com matrícula PR-AAL exatamente porque o Brasil não é nada atrativo na questão fiscal. Ao mesmo tempo não é claro se a ANAC permitiria uma operação comercial de longo prazo de aeronaves de matrícula estrangeira por empresas brasileiras ou de aviões matriculados no Brasil voando comercial em aéreas gringas.