“Tudo estava procedendo normalmente, até que eu ouvi o ‘ronco’, o último suspiro do Comandante Mike” essas foram as palavras do Primeiro Oficial Steve.
Aquele estava programado para ser um voo de rotina, um voo transcontinental durante a madrugada (o termo transcontinental, nos EUA é para voos domésticos sem escalas ligando a costa oeste a leste ou leste a oeste). O voo estava sendo comandado pelo piloto e veterano da American Airlines, Mike Johnston e pelo Primeiro Oficial Steve Stackelhouse. Ambos totalmente qualificados e habilitados para o Airbus A320, que faria a rota de Phoenix, Arizona, na costa oeste, para Boston, Massachusetts, na costa leste.
No voo AA550 estavam 147 passageiros e 2 crianças, além da tripulação.
Como hábito das tripulações, os 2 pilotos combinaram de cada um fazer um trecho em comando durante a jornada de trabalho conjunta, que é de 3 dias. O primeiro trecho seria pilotado pelo Comandante Mike. “Estávamos em voo de cruzeiro no nível de voo 350, em torno de 3h45 de voo realizadas na nossa jornada” disse o primeiro oficial Steve, “Ainda estávamos a 250 milhas (463km) de Boston e o sol estava começando a nascer ao leste.”
Steve observou que Mike usou sua máscara de oxigênio algumas vezes, tragando o ar mais puro. Porém ele não achou nada de errado, usar a máscara para obter oxigênio mais puro é uma maneira de revigorar-se, pilotos fazem isso frequentemente, especialmente em voos noturnos.
“Ele deu nenhuma indicação que estava com algum problema.” disse Steve.
“Mike retirou a máscara, colocou de volta no local dela e deitou sua cabeça no encosto, em um minuto eu ouvi um ‘ronco’, que mais tarde seria dito como o último suspiro dele.”
Pensando que Mike dormira ou que estava inconsciente, Steve chacoalhou o comandante, porém sem resposta. Ele imediatamente chamou a comissária-chefe Jennifer Sullivan, uma enfermeira formada, que começou a dar assistência ao paciente. Ela não conseguia achar nenhum sinal de pulso.
“Ela me sugeriu pousar o avião imediatamente” Steve relatou “Eu declarei emergência médica ao controle de tráfego aéreo e começamos a busca por um aeroporto adequado e próximo.”
Normalmente, durante uma emergência, os dois pilotos dividem o trabalho, com um voando a aeronave e operando os rádios, enquanto o outro lidava com a emergência. Porém dessa vez Steve estava sozinho. “Eu entrei em um modo de calma com foco na missão”, disse Steve, “e muito metodicamente passando pelo processo para pousarmos rapidamente”.
O A320 é um avião altamente automatizado, que alivou bastante o trabalho de Steve. Mesmo assim, como sendo o único piloto nos minutos seguintes, ele estava bastante ocupado – simultaneamente pilotando o avião, operando os rádios e procurando por um aeroporto de alternativa.
Steve também enviou a mensagem pelo ACARS – Sistema de Endereçamento e Reporte de Comunicações da Aeronave, para alertar o despachante da companhia aérea. Em qualquer voo o comandante e o despachante decidem juntamente quando alternar e qual aeroporto é adequado. O sistema é de uma maneira pesado e lento para resposta, Steve não recebeu resposta imediata. Ele teve que decidir sozinho.
Steve disse: “eu identifiquei o aeroporto de Syracuse (KSYR) como o mais adequado, mesmo que estivéssemos a 50 milhas dele (92km). Eu já tinha pousado em KSYR antes, de alguma maneira já me era familiar, então pedi direções para Syracuse, no estado de Nova Iorque.” O controle de trafego aéreo aceitou o pedido e lhe deu uma autorização para descer até 11.000 pés. Como estava em emergência, o voo 550 teria pouso prioritário.
Enquanto Steve fazia a descida acentuada para Syracuse, a comissária-chefe Jennifer dava assistência para o paciente.
O comandante, porém, estava preso firmemente aos cintos de segurança, limitando a ajuda da comissária. “Mike estava em uma posição em que Jennifer não poderia fazer a ressuscitação cardiopulmonar (RCP) e as compressões peitorais estavam fora de questão enquanto ele estivesse preso aos cintos.” Além disso, tirar o comandante do seu assento tinha o risco de ele esbarrar em algum controle de voo, então ficou decidido que ele ficaria com os cintos afivelados.
“Nós estávamos no solo no que parecia ter sido poucos minutos”, disse Steve. “Tudo parecia surreal naquele momento.” Steve taxiou rapidamente para o gate e, assim que parou, os paramédicos correram para dentro da aeronave. “Os paramédicos colocaram o que parecia ser um eletrocardiógrafo” (equipamento usado para fazer eletrocardiograma e medir a atividade elétrica no paciente). “Porém, não obtiveram nenhum tipo de sinal.” O Comandante Mike Johnston foi declarado morto.
Uma tripulação substituta levou os passageiros até Boston, enquanto Steve e a tripulação original receberam folga. De fato, Steve conhecia o Comandante Mike por algum tempo, e depois disso ficou um realmente chocado: “eu e o Mike ficamos baseados juntos em Las Vegas (KLAS) anos atrás”, Steve lembrou. “Nós fizemos várias viagens juntas. Mike sempre foi muito amigável e tivemos várias conversas.”
Steve já está de volta aos voos, porém, de alguma maneira, a experiência serviu para reforçar as ligações já fortes com sua família. Acompanhado de sua esposa Kris, ele cuida de seus 3 filhos. Em seus planos futuros estão em viver em uma casa em frente ao lago com a esposa e curtir o tempo juntos viajando. A vida e os voos devem continuar.
O Primeiro Oficial Steve Stackelhouse complementa agradecendo a assistência fornecida pelo controle de tráfego aéreo durante a crise. “Eles foram muito precisos, convenientes e ajudaram nas comunicações e na assistência a mim.” disse Steve.
Ele também gostaria de agradecer ao despachante Jen, comandante Peter Blandino, Comandante James Condes, os pilotos voluntários e primeiros oficiais Ken Hagen e Jeff Gonzales, além dos comandantes Ken Hewitt, John Scherf, e Bill Duxbury. Em particular, ele disse que apreciou o debriefing feito pela companhia aérea, especificamente pelo Diretor do Programa de Assistência aos Empregados, Ellyn Kravette.
Steve disse que às vezes pensa em Mike e em sua família.
Em nome do AEROIN, deixamos aqui todas as condolências a família e amigos do Comandante Mike Johnston.
Artigo original por Eric Auxier (Cap’n Aux) que será publicado na tradicional revista Airways News na edição de Fevereiro de 2016, edição atual da revista está disponível em diversas bancas no Brasil.
Versão online reduzida foi traduzida e adaptada por Carlos Martins.
Eric Auxier é um comandante de A320 voando em uma grande companhia aérea do EUA, com mais de 21.000 horas de voo e 35 anos de carreira. Ele é bastante conhecido no meio pelos seus 6 livros publicados e seu famoso blog As Aventuras do Comando Aux, blog em inglês mas que vale a pena dar uma conferida com várias histórias, entrevistas e dicas de um experiente piloto, para acessar o blog dele clique aqui.